Agricultura Familiar

Agricultura familiar, um futuro sustentável no semiárido brasileiro
A agricultura familiar aparece para a economia do país como importante atuante na geração de alimentos e, consequentemente, do crescimento do mercado financeiro nacional, respondendo ainda por 30% da produção mundial. Cerca de 60% dos alimentos que abastecem o mercado interno vêm da agricultura familiar. Esta atividade emprega 77% dos 17 milhões de brasileiros que trabalham no campo, o que garante a sustentabilidade do setor e alavanca a qualidade de vida de famílias agricultoras pelo Brasil.
O desenvolvimento histórico da agricultura brasileira obedece basicamente a dois modelos distintos. Por um lado, a agricultura familiar e camponesa que privilegia a qualidade de vida, a soberania alimentar, a geração de emprego e a produção familiar. Por outro, o agronegócio, baseado na monocultura, na concentração de terra, no uso intensivo de agrotóxico e de sementes geneticamente modificadas, causando assim uma destruição ambiental. A agricultura familiar contribui para uma relação cultural e social entre os produtores, a terra e seus frutos, aquecendo a economia local. O agronegócio substitui o trabalho humano por máquinas, volta a maior parte de sua produção para o mercado externo e ainda concentra a grande parte das terras agricultáveis.   
A coordenadora da Cáritas Diocesana de Pesqueira e membro da Coordenação Nacional da Articulação no Semi-Árido (ASA), Neilda Pereira, reforça a importância da agricultura familiar e sua relação com o agronegócio: “a agricultura familiar é cheia de desafios, se por um lado vemos uma grande ofensiva lógica do agronegócio, que despreza a agricultura familiar, por outro percebemos indicativos de mudanças desde a organização dos agricultores até a intervenção nas políticas públicas”.  
O economista da Universidade de São Paulo (USP), Ricardo Abramovay, afirma em seus estudos que em países onde a agricultura familiar é amplamente aplicada existe um desenvolvimento maior da agricultura e uma minimização das desigualdades sociais.  Muitas cidades pelo Brasil dependem desse tipo de atividade, mas desafios e entraves se colocam no caminho do trabalhador rural. Para que o crescimento da agricultura ocorra, faz-se necessário o uso de tecnologias apropriadas no desempenho das tarefas agrárias e a adoção de condições político-institucionais, como o acesso a créditos, informações organizadas, canais de comercialização, transporte, energia e tantos outros. 
Outro ponto que emerge como fundamental para o desenvolvimento desse setor vem da mobilização de agricultoras e agricultores familiares através de organizações. Associações, sindicatos e cooperativas são bons exemplos e se posicionam não somente como agentes de desenvolvimento da agricultura, mas contribuem com uma sociedade mais justa, na medida em que buscam soluções e capacitações conjuntas para seus integrantes e para o mercado onde atuam.
O destempero climático que várias regiões de atuação agrícola familiar estão submetidas também merece atenção. Cerca de 50% dos estabelecimentos rurais encontram-se no Nordeste brasileiro, principalmente nas regiões semiáridas. Por deter uma terra de pouca umidade e chuvas irregulares, a agricultura nessas regiões exige não só uma dose maior de criatividade e ousadia, mas, sobretudo, uma visão mais ampla a partir do desenvolvimento de ações que garantem a sustentabilidade e o equilíbrio das propriedades rurais. Muitos são os agricultores que aprendem, e bem, a convivência com esse tipo de clima de vegetação difícil.   
Por muito tempo o Nordeste foi conhecido como uma região seca e miserável. As políticas assistencialistas nunca se voltavam para resolver os problemas do povo dessa região, sempre foi mantida e favorecida a concentração da terra nos grandes latifúndios e nos projetos do agronegócio. Enquanto isso, muitos agricultores e agricultoras ainda trabalham em terras alheias ou em minifúndios super explorados, fragilizando sua própria segurança alimentar (ASA, Ceará, 2006).
No entanto, nos últimos dez anos outro cenário começa a surgir. Através da valorização de tecnologias simples e sustentáveis, desenvolvidas para a adaptação da agricultura nesse tipo de clima, o trabalhador rural pode trabalhar o ano todo com a água, e utilizá-la tanto nas plantações e na criação animal, como também para seu uso doméstico. Cisternas, tanques de pedra, biodigestores, barragens subterrâneas, bombas populares e outras tecnologias são fortes agentes de transformação sustentável e de avanços no campo da agricultura familiar.       

Biodigestor – Tecnologia que utiliza o estrumo de vacas e bois para a produção de biogás. 

Canteiro Econômico– A Cisterna (ao fundo) armazena a água das chuvas e pode irrigar a plantação por todo o ano, evitando desperdícios e possibilitando uma agricultura sustentável.  

Esse conjunto de experiências atreladas ao processo de mobilização social fortalece as associações locais, sindicatos, cooperativas e ONG´s. A Articulação no Semi-Árido Brasileiro (ASA Brasil) contribui com a criação e o fortalecimento de políticas públicas voltadas para a região semiárida, verificando as necessidades e as potencialidades das populações locais, e firmando um compromisso em especial com agricultores e agricultoras familiares. A ASA desenvolve um programa de Formação e Mobilização Social para Convivência com o Semiárido, a partir de duas linhas de ações: Um Milhão de Cisternas (P1MC) e Uma Terra e Duas Águas (P1+2). A ideia é construir alternativas e tecnologias adequadas para a agricultura familiar semiárido.

Tanque de Pedra de Seu Heleno – reservatório que armazena a água das chuvas e pode abastecer 10 famílias agricultoras.  

A Diocese de Pesqueira, através da Cáritas Diocesana, executa o P1+2 no território do Agreste Setentrional de Pernambuco. Entre 2009 e 2010, o programa já construiu 229 cisternas calçadão e mais outras 71 tecnologias, beneficiando cerca de 34000 agricultores na região. Atualmente, esse número vem crescendo, e mais tecnologias estão sendo levantadas em demais regiões de atuação da ASA em parceria a outras organizações da sociedade civil. Esse trabalho possibilita a manutenção da atividade rural e a comercialização do excedente da produção agrícola. Além da construção de tecnologias, a Articulação realiza capacitações e intercâmbios de conhecimentos para as famílias agricultoras atendidas pelo programa, qualificando a produção agrária e efetivando a cidadania.  
O desenvolvimento sustentável da agricultura familiar gera a renda das famílias rurais, movimentando o mercado através da comercialização de sua produção. Essa etapa econômica se desdobra para um mercado maior, o nacional e até mesmo o internacional, solidificando a estrutura econômica do país. Como essa estrutura vem de uma base rural sólida, ela se sustenta e abre cada vez mais espaços para o crescimento do mercado econômico. O caminho inverso, iniciando de grandes comércios e empresas, dificilmente emplacaria esses mesmos avanços, pois os benefícios gerados restringir-se-iam para esse setor dificultando o caminho até o agricultor rural.   
A agricultura familiar insere-se em um contexto social, econômico, ambiental, político e cultural. A partir de sua consolidação, será possível desenhar um futuro prospero para as famílias agricultora e viável para um país que se alimenta e se desenvolve, também, a partir da agricultura familiar.             
“Pensar em agricultura sustentável é pensar em formas de produção que garantam as condições indispensáveis á preservação da vida, por isso nós da ASA trabalhamos com base na agroecologia como um sistema de produção que procura imitar os processos como ocorrem na natureza, evitando romper o equilíbrio ecológico que dá a estabilidade aos ecossistemas naturais“ - Neilda Pereira. 
Produtos da agricultura familiar, livres de agrotóxicos o que possibilita a saúde ambiental e humana.  

Definição de Agricultor Familiar segundo a lei nº 11.326, de 24 de julho de 2006.
“Considera-se agricultor familiar e empreendedor familiar rural aquele que pratica atividades no meio rural, utilizando áreas menores que 4 hectares,  obtendo sua renda familiar basicamente das suas atividade e dirigindo seu estabelecimento ou empreendimento junto com sua família que também é,  predominantemente, a mão de obra utilizada nessa atividade.” 


Autoria:
Arméle Dornelas
Publicitária, Comunicadora Popular da Cáritas Diocesana de Pesqueira e membro do núcleo de Comunicação da ASA Pernambuco.